domingo, 27 de setembro de 2015

Comentários preliminares (com gabarito extraoficial) à prova do STJ

Meus caros,
contando com a ajuda de prestativos alunos amigos, que me mandaram cópia das provas, seguem os comentários preliminares (com minha sugestão de gabarito) às provas de técnico e de analista do STJ, aplicadas hoje (27/09/2015).

Prova de Técnico:

1) Ações afirmativas são mecanismos que visam viabilizar uma isonomia material em detrimento de uma isonomia formal por meio do incremento de oportunidades para determinados segmentos.
Resposta sugerida: correto.
Comentário: as ações afirmativas, ou discriminação positiva, realmente se baseiam na igualdade (ou isonomia) material, que visa justamente a reduzir desigualdades. 

2) A dimensão substancial da liberdade de expressão guarda relação íntima com o pluralismo político na medida em que abarca, antes, a formação da própria opinião como pressuposto para sua posterior manifestação.
Resposta sugerida: correto. 
Comentário: questão relativamente fácil, pois, como se sabe, um dos aspectos do pluralismo político é, ao lado do multipartidarismo, a liberdade de expressão. Ou, como dizemos em sala de aula, não há democracia (pluralismo) sem liberdade de expressão. Tema do item 6.5 da aula 3 na Turma Platinum.

3) A superveniência de nova constituição não afetará o direito adquirido na ordem constitucional anterior.
Resposta sugerida: errado.
Comentário: muitos podem pensar que a questão é sobre poder constituinte (e estaria, assim, fora do edital). Entendemos que não: a questão é sobre direitos fundamentais (direito adquirido). Não há, porém, direito adquirido contra nova constituição, contra manifestação do poder constituinte originário. Tema que abordamos no item 2.4 de nossa segunda aula na Turma Platinum.

4) As constituições dirigentes privilegiam as liberdades individuais, impondo ao estado um dever de abstenção e um papel secundário na concretização dos valores fundamentais.
Resposta sugerida: errado.
Comentário: trata-se da classificação das constituições segundo os objetivos (tema que tratamos no item 2.8 de nossa primeira aula na Turma Platinum). A questão está errada, pois o conceito exposto corresponde ao de constituição garantia. Constituição dirigente é justamente aquela que impõe objetivos e metas ao Estado, transformando-o em vetor da concretização dos valores fundamentais.

5) Segundo o pensamento ideológico político-liberal surgido a partir do século XIX, toda constituição deve consagrar direitos fundamentais e a separação de poderes.
Resposta sugerida: correto.
Comentários: trata-se do conceito material de constituição (tema do item 2.1 da aula 1 da Turma Platinum). Poderá gerar polêmica, contudo, o "a partir do século XIX", já que o movimento liberal surge antes, no século XVIII. Não acho, porém, que a questão cronológica seja o cerne da alternativa. Aguardemos o gabarito oficial para ver se cabe recurso.

6) A constituição é instituto multifuncional que engloba entre seus objetivos a limitação do poder e a conformação e legitimação da ordem política.
Resposta sugerida: correto.
Comentários: é o conceito básico de constituição, como o documento que impõe limites ao poder do estado e trata da organização política do país.

Balanço da prova de técnico: uma prova bem doutrinária, como parece que vai ser a tendência do Cespe nos próximos tempos. Estranho, porém, não ser cobrada nenhuma questão sobre organização do Estado nem sobre Poder Judiciário. No mais, acho que não haverá surpresas no gabarito oficial.

Prova de Analista:

1) O registro do sindicato no órgão competente é exigência constitucional que não se confunde com a autorização estatal para a fundação da entidade.
Resposta sugerida: correto.
Comentários: tema do item 5.2. da aula 6 da Turma Platinum. Não se exige autorização estatal (ato discricionário) para a fundação de sindicato, embora se exija o registro no órgão competente (art. 8º, I), até mesmo para assegurar o respeito ao princípio da unicidade sindical.

2) Um cidadão detém, mais que o direito, o dever de opor-se à ordem que, emanada de autoridades públicas, se revele manifestamente ilegal.
Resposta sugerida: correto.
Comentários: trata-se do direito (e dever) de resistência, decorrente do princípio do Estado de Direito. Questão incomum de ser cobrada em prova do Cespe, mas dentro do programa.

3) A garantia do mínimo existencial, que decorre da proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, restringe a invocação da reserva do possível como óbice à concretização do acesso aos direitos sociais.
Resposta sugerida: correto.
Comentário: questão exaustivamente tratada no item 2 da aula 9 da Turma Platinum (Direitos Sociais) e que tratamos também nas turmas de exercícios para o STJ. Realmente, o princípio do mínimo existencial restringe que o Estado alegue a reserva do possível como obstáculo à efetivação dos direitos sociais. Tema bem aprofundado, mas os alunos que estudaram bem o conteúdo não devem ter tido dificuldade.

4) A livre iniciativa é princípio que subordina as normas de regulação do mercado e de defesa do consumidor.
Resposta sugerida: correto.
Comentários: questão um pouco obscura e ambígua. Entendo, porém, estar correta, pois a livre iniciativa, como é fundamento da República, informa a interpretação de toda a ordem constitucional.
Atualização às 17h19 do dia 28/09: o aluno Leonardo Reis nos altera que há precedente do STF no seguinte sentido: "O princípio da livre iniciativa não pode ser invocado para afastar regras de regulamentação do mercado e de defesa do consumidor." (RE 349.686, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 14-6-2005, Segunda Turma, DJ de 5-8-2005.). Sendo assim, é provável que o Cespe dê a questão como errada. Aguardemos, pois, nesse caso, eu sugeriria recurso, pois embora o princípio não possa afastar a proteção do consumidor (é o que diz o precedente), não é isso o que se afirma na questão (já que os princípios se subordinam reciprocamente).

5) O princípio da unicidade, que veda a criação, na mesma base territorial, de mais de uma organização sindical representativa de mesma categoria profissional, não alcança entidades que, no âmbito de um mesmo município, mas em bairros distintos, representem a mesma profissão.
Resposta: errado.
Comentário: o princípio da unidade sindical (art. 8º, II) impede a criação de dois sindicatos representativos da mesma categoria na mesma base territorial - base essa que não pode ser inferior à área de um Município.

6) Compete, originariamente, ao STJ julgar mandados de segurança contra atos do Superior Tribunal de Justiça Desportiva.
Resposta sugerida: errado.
Comentário: a competência é do juiz de primeira instância, ante a falta de qualquer previsão específica na CF. O aluno poderia até nem saber de quem seria a competência, mas iria lembrar que a competência do STJ é taxativa - e do art. 105 não consta qualquer referência aos mandados de segurança contra o STJD. Nesse sentido: STJ, MS nº 11.225/RJ, Relatora Ministra Nancy Andrighi.

7) O controle administrativo exercido pelo CNJ é subsidiário e pressupõe prévia atuação dos tribunais ordinários. 
Resposta sugerida: errado 
Comentários: de acordo com a jurisprudência do STF, o poder do CNJ é concorrente com a fiscalização dos tribunais: uma não exclui nem condiciona a outra.

8) O controle interno exercido pelo CNJ não alcança atos de conteúdo jurisdicional emanados de tribunais.
Resposta sugerida: correto.
Comentários: questão clássica. Falamos diversas vezes (aula 21 da Turma Platinum, item 12.3) que o CNJ é órgão de controle interno (STF, Pleno, ADI nº 3.367/DF) e que não possui jurisdição. Não pode, portanto, rever atos de conteúdo jurisdicional. Agora, quem estudou por material em pdf que diz que o CNJ é de controle externo e tem jurisdição em todo o território pode ter se dado mal... Espero que não.

Balanço da prova de analista: mais equilibrada que a prova de técnico. Dificuldade mediana, dentro do esperado. A lamentar apenas a falta de questões sobre organização do Estado.

Espero que todos tenham feito uma boa prova.
Abraços e bons estudos!

ATUALIZAÇÃO ÀS 10H41:
O GABARITO DO CESPE CORRESPONDEU ÀS NOSSAS RESPOSTAS, EXCETO A QUESTÃO 4 DA PROVA DE ANALISTA, SOBRE A QUAL SUGIRO O RECURSO A SEGUIR:
Sugestão de recurso:
Questão nº (ver o número da questão no seu caderno de prova)
Gabarito preliminar: errado.
Gabarito pretendido: anulação.
A banca considerou errada a afirmação de que a livre iniciativa subordina as regras do mercado e da defesa do consumidor. Cremos que a banca baseou-se no precedente do STF no julgamento do RE 349.686. Contudo, naquela oportunidade, o Supremo não afirmou que a livre iniciativa não subordina esses princípios, mas que a livre iniciativa não afasta esses princípios. Ora, a livre iniciativa é fundamento da república, que, por seu caráter principiológico, subordina (e se subordina reciprocamente) aos demais princípios, segundo as lições de Robert Alexy (Teoria dos Direitos Fundamentais, p. 91). Em outras palavras: a banca trocou a palavra "afasta" por "subordina", o que muda completamente o sentido. Assim sendo, pleiteia-se a anulação da questão, por ser, na melhor das hipóteses, ambígua.

16 comentários:

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  2. Nossa! Não acredito que só errei uma. Fiz para analista mas achei a prova bem difícil. Só caiu orçamento público, praticamente! :(

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  3. Gabaritei Constitucional e Sustentabilidade. A livre iniciativa é muito mais ampla do que livre concorrência. E é fundamento do RFB. Concordo com o professor, mas há outros professores dando como errada a questão. Pode ser anulada. Minha torcida é que o professor João esteja correto.

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    1. Deveria ter imaginado que a livre iniciativa, princípio basilar do liberalismo, fosse um pecado dentre pindoramas!

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  7. Correção apenas para Constitucional?

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  8. Veja este artigo: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-livre-concorrencia-e-a-defesa-do-consumidor-em-direito-economico,37384.html

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  9. Achei uma tese de recurso. O comando da questão identifica apenas a livre iniciativa como princípio. A regulação e defesa ao consumidor como normas. Pode-se dizer que princípios são juízos abstratos de valor que orientam a interpretação e a aplicação do Direito. Os princípios possuem um caráter de dever e de obrigação. Basta violar um princípio para que toda aquela conduta praticada esteja ilegal. Por esse motivo, violar um princípio é muito mais grave do que violar uma norma. Devido a este fato os princípios representam uma ordem, a qual deve ser acatada. Assim, sempre que a Administração Pública for agir, todos os princípios deverão ser respeitados.

    Acentua Celso Antônio Bandeira de Mello que princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que ser irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a Tônica que lhe dá sentido harmônico. Adverte o autor que violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos.

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  10. Para Josef Esser, princípios são aquelas normas que estabelecem fundamentos para que determinado mandamento seja encontrado. Mais do que uma distinção baseada no grau de abstração da prescrição normativa, a diferença entre os princípios e as regras seria uma distinção qualitativa. O critério distintivo dos princípios em relação às regras seria, portanto, a função de fundamento normativo para a tomada de decisão[3].

    Seguindo o mesmo caminho, Karl Larenz define princípios como normas de grande relevância para o ordenamento jurídico, na medida em que estabelecem fundamentos normativos para a interpretação e aplicação do direito, deles decorrendo, direta ou indiretamente, normas de comportamento[4].

    Consoante Robert Alexy princípios são normas que ordenam algo que, relativamente às possibilidades fáticas e jurídicas, seja realizado em medida tão alta quanto possível. Princípios são, segundo isso, mandamentos de otimização, assim caracterizados pelo fato de a medida ordenada de seu cumprimento depender não só das possibilidades fáticas, mas também das jurídicas[5]. Na lição de Canotilho, princípios são normas jurídicas impositivas de uma otimização, compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionamentos fácticos e jurídicos. Para o mestre português, os princípios se distinguem das regras pelo fato destas últimas serem “normas que prescrevem imperativamente uma exigência (impõe, permitem ou proíbem) que é ou não cumprida”[6].

    Conforme os estudos de Dworkin, no caso de colisão entre regras, uma delas deve ser considerada inválida. Os princípios, ao contrário, não determinam absolutamente a decisão, mas somente contêm fundamentos, os quais devem ser conjugados com outros fundamentos provenientes de outros princípios. Daí a afirmação de que os princípios, ao contrário das regras, possuem uma dimensão de peso, demonstrável na hipótese de colisão entre princípios, caso em que o princípio com peso relativo maior se sobrepõe ao outro, sem que este perca sua validade[7]. Por conseguinte, Humberto Ávila expõe que as regras são normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência, sempre centrada na finalidade que lhes dá suporte ou nos princípios que lhes são axiologicamente sobrejacentes, entre a construção conceitual da descrição normativa e a construção conceitual dos fatos. Já os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção[8].

    Vale ainda transcrever aqui as palavras de Alexandre Aboud, Procurador do Estado de São Paulo, que ensina que os princípios orientam e implementam o direito por caminhos abstratos, que dão rumo a todo um sistema normativo. Constituem-se, portanto, normas hierarquicamente privilegiadas, com predominância sobre outras regras por formarem o arcabouço do ordenamento jurídico[9].

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  11. Fiz a prova de Técnico. Total 55 pontos, já descontados os erros e as questões em branco. Ou seja, já era minha chance, posso continuar focando em outros concursos, kkkkkkk!

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  12. Obrigada pela correção. Professor nota mil.

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