quarta-feira, 6 de março de 2013

O controverso princípio do promotor natural

Meus caros,
como se aproxima o concurso do MPU, e como o tema "Funções essenciais à Justiça" vem caindo muito também em vários outros concursos, resolvi fazer um post sobre o controverso princípio do Promotor Natural. 
Essa explicação consta da 2ª edição do meu livro"Legislação Aplicada ao MPU", que será lançada brevemente pela Editora LeYa/Alumuns!
Vamos às explicações!


O princípio do promotor natural é, de acordo com a maioria dos estudiosos, um princípio que se encontra implícito na CF.
         Existem duas visões acerca do princípio do promotor natural: uma, mais ampla, que o entende – à semelhança do princípio do juiz natural (esse, sim, expresso na CF, no art. 5º, XXXVII e LIII) – como uma garantia contra a substituição de um membro originalmente designado para um processo por outro membro; já numa visão mais estrita – e que é a predominante na doutrina e na jurisprudência – o princípio do promotor natural significa que o membro designado para atuar em um processo dele não pode ser retirado arbitrariamente, nem pode haver manipulação na distribuição de processos aos membros do MP.
         Particularmente, entendemos que esse princípio não está implícito na CF. Caso se entenda que o conteúdo dessa norma seria uma impossibilidade de substituição de um membro “natural” por outro, isso iria contrariar o princípio (expresso) da indivisibilidade. Por outro lado, se se adotar o conceito restrito, nada mais se tem do que a proibição do desvio de finalidade (manipulação de distribuição de processos, etc.), o que é vedado em toda a administração pública (apenas de não existir um princípio do “administrador natural”).
         Porém, para concursos públicos recomendamos adotar a tese da doutrina majoritária, no sentido de que o princípio do promotor natural está implícito no ordenamento constitucional brasileiro, no sentido estrito (proibição da designação casuística de membro para atuar em um processo). Essa é a posição mais segura, inclusive para a prova dissertativa, embora seja possível registrar a existência de outros pontos de vista.
         Na jurisprudência, o tema também é controverso. O próprio STF já chegou a sustentá-lo, em 1993, mas voltou atrás e, em 2008, consignou com todas as letras que o Brasil não adotava tal preceito  (STF, 2ª Turma, HC 90.277/DF, Relatora Ministra Ellen Gracie, DJE de 1º.08.2008). Nessa época, a própria doutrina reconhecia que “a Corte Suprema, por maioria de votos, refutou a tese do princípio do promotor natural no ordenamento jurídico brasileiro (HC 67.759/RJ, DJU de 1º.7.93), orientação essa confirmada, posteriormente, na apreciação do HC 84.468/ES (DJU de 20.2.2006) e de outros acórdãos mais recentes[1].
         Contudo, esses precedentes foram superados, pois, em julgados posteriores, o STF deu sinais de que reconhece o princípio do promotor natural como imanente ao ordenamento brasileiro. Veja-se, por exemplo, o HC 103.038/PA, 2ª Turma, Relator Ministro Joaquim Barbosa, julgado em 11.10.2011.

         Como a matéria é cobrada pelas bancas?

         Na prova ESAF/MPU/Analista Administrativo/2004, quando se pedia um princípio que não era aplicável ao Ministério Público, a resposta oficial foi a letra “d”: princípio do promotor natural.       
         Já no concurso para Técnico de Notificações do TCE-RJ, elaborado pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Rio de Janeiro em 2012, cobrou-se a seguinte questão:

De acordo com a construção doutrinária e jurisprudencial, configura hipótese de violação do princípio do promotor natural:
A) designação de órgão de composição pluripessoal, de atuação despersonalizada, com anuência do Promotor de Justiça com atribuição natural;
B) designação de Promotores de Justiça em sistema de mutirão, com anuência do Promotor de Justiça com atribuição natural;
C) designação de um Promotor de Justiça cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em lei;
D) designação prévia e motivada de um Promotor de Justiça para atuar na sessão de julgamento do Tribunal do Júri, com anuência do Promotor de Justiça com atribuição natural;
E) designação de um Promotor de Justiça ad hoc ou de exceção com a finalidade de processar uma pessoa ou caso específico.

         A resposta considerada correta foi a letra “E” (que realmente implica uma violação ao princípio do promotor natural, na visão restrita adotada pela doutrina majoritária). Note-se que a questão sequer discutiu a aplicação do princípio ao Direito brasileiro: apenas perguntou qual das situações o violaria.
         Na prova para Analista Judiciário – área judiciária do TJ/AL, elaborado pelo Cespe, foi considerada errada a seguinte alternativa: “Constituem princípios institucionais do Ministério Público (MP) a unidade, a indivisibilidade, o promotor natural, mas não a independência funcional, já que o órgão do MP sujeita-se às ordens emanadas do chefe da instituição.”. Como se percebe, o erro está em afirmar que não é princípio institucional do MP a independência funcional, mas provavelmente a banca considerava certa a alternativa, até antes do “mas não”...
         Em provas anteriores, o Cespe adotava a posição jurisprudencial do STF no sentido de não se admitir o princípio do promotor natural. Justamente por isso, na prova para Promotor de Justiça do MPE-SE, aplicada em 2010, a banca considerou errada a afirmação segundo a qual “O princípio do promotor natural, imanente ao sistema constitucional brasileiro, impede que, em situações estritas e definidas na lei, seja afastado o promotor de justiça do processo em que deveria atuar ou removido da promotoria de que seja titular”. Porém, de forma contraditória, no mesmo ano – e antes da mudança de entendimento do STF, a banca cobrou na prova para Analista Processual do MPU questão, considerada correta, que afirmava que “O princípio do promotor natural decorre da independência funcional e da garantia da inamovibilidade dos membros da instituição”.
         Já a FCC, na prova para Técnico Judiciário do TST (2012), cobrou a seguinte questão:

Ao discorrer sobre os princípios constitucionais que devem informar a atuação do Ministério Público, Pedro Lenza afirma que o acusado “tem o direito e a garantia constitucional de somente ser processado por um órgão independente
do Estado, vedando-se, por consequência, a designação arbitrária, inclusive, de promotores ad hoc ou por encomenda” (Direito Constitucional Esquematizado − Saraiva − 2011 − p. 766). Trata-se do princípio
(A) da inamovibilidade do membro do Ministério Público.
(B) da independência funcional do membro do Ministério Público.
(C) da indivisibilidade do Ministério Público.
(D) da unidade do Ministério Público.
(E) do promotor natural.

         A resposta foi a alternativa “E”, que realmente é a que se refere ao conteúdo da explicação. Mais uma vez, a banca não questionava se o princípio era ou não adotado no Direito brasileiro (embora isso esteja implicitamente assumido ao se cobrar o tema).
         Em resumo, pode-se afirmar que as bancas, em geral, adotam a tese da doutrina majoritária, no sentido de que o princípio do promotor natural é adotado no ordenamento jurídico brasileiro, vedando designações casuísticas ou a substituição arbitrária de membros do MP. Essa é a posição mais segura para ser levada em consideração pelo candidato na hora da prova.
         Em resumo:

Posição doutrinária
Significação
Bancas que já adotaram expressamente
Posição do STF
Promotor natural (vertente radical)
Exatamente como acontece em relação ao princípio do juiz natural (art. 5º, LIII), o membro que atua em um processo não pode ser substituído, a não ser em casos especialíssimos. A possibilidade de substituição não é a regra, é a exceção
Nenhuma
Nunca foi adotada pelo STF
Promotor natural (vertente moderada)
Pode haver a substituição de um membro por outro (princípio da indivisibilidade), desde que não seja feita de forma arbitrária, respeitando-se também o fato de que não pode haver designação casuística
FEMPERJ (2012), Cespe (2012) e FCC (2012)
É a posição atualmente adotada pelo STF (HC 103.038/PA)
Inexistência do princípio do promotor natural
O princípio não está implícito no ordenamento brasileiro, pois é incompatível com o princípio expresso da indivisibilidade
ESAF (2004)
Foi a posição adotada pelo STF entre 2008 e 2011 (HC 90.277)

PS: Esse e outros temas eu trato no meu curso online de Direito Constitucional do Tempo de Concurso. Vou começar a gravar também, ainda em março, o curso de Legislação Aplicada ao MPU. Para quem quiser adquirir esses ou outros cursos (bem como livros), é só clicar aqui.


[1]     ZENCKER, Marcelo; ALVES, Leonardo Barreto Moreira. Ministério Público, p. 18. Salvador: JusPodivm, 2009.

7 comentários:

  1. Professor, quando sai esse seu livro de Legislação Aplicada ao MPU?

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  2. Devo entregar para a editora ainda este mês, então deve estar à venda em abril!

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  3. Professor, não irá mais comentar sobre a LINDB?

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  4. Essa foi melhor explicação sobre o principio do Promotor Natural que achei na internet.

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  5. trata-se de questão de prova. O gabarito aponta a letra D como a correta.

    QUESTÃO: C.F. Art. 5 , LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.
    Tal dispositivo consagra os princípios respectivamente:
    A) do Devido Processo Legal e do Juiz Natural
    B) da Inafastabilidade da Jurisdição e do Promotor Natural
    C) da Preseunção de Inocência e do Juiz Natural
    D) do Promotor Natural e do Juiz Natural

    Erra aquele que opta pela alternativa A ? já que o princípio do promotor natural é corolário do devido processo legal.
    É cabível recurso para anular tal questão ? já que é patente a divergência doutrinária bem como a própria jurisprudência do STF.

    nei souza
    weneidner@gmail.com

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