quarta-feira, 9 de maio de 2012

Recurso - questão 110 - Agente da PF/Cespe/2012

Meus caros,
segue recurso que sugiro contra a questão nº 110 da prova de Agente da Polícia Federal.

Questão nº 110.

Enunciado: "O direito ao silêncio, constitucionalmente assegurado ao preso, estende-se a pessoa denunciada ou investigada em qualquer processo criminal, em inquérito policial, em processo administrativo disciplinar e àquela que for convocada a prestar depoimento perante comissão parlamentar de inquérito".

Gabarito preliminar: certo.

Gabarito pretendido: anulação.

Fundamentação:

A questão trata da abrangência do direito constitucional ao silêncio, notadamente aplicável também a qualquer pessoa que ostente a condição jurídica de imputado em processos criminais ou administrativos (STF, 1ª Turma, HC 68.929/SP, Relator Ministro Celso de Mello).
Porém, o enunciado é ambíguo e pode induzir o aluno em erro, ao afirmar que tal prerrogativa aplica-se também a quem é convocado a depor em comissão parlamentar de inquérito.
Ora, a testemunha tem o dever de falar a verdade sobre os fatos de que tenha conhecimento. O descumprimento desse dever importa, em tese, no cometimento do delito previsto no art. 4º, II, da Lei nº 1.579/52, que dispõe: “Constitui crime: (…) II – fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, tradutor ou intérprete, perante a Comissão Parlamentar de Inquérito”.
Apesar desse dispositivo, existem situações que isentam do dever de falar a verdade, de modo que eventual silêncio – ou mesmo negação de fatos verídicos1 – pode não configurar crime.
Assim, mesmo a testemunha compromissada não está obrigada a narrar fatos que a incriminem2 (direito à não-autoincriminação e direito ao silêncio, normalmente afetos apenas ao investigado, por ser estendidos, nessa situação). O advogado intimado a depor como testemunha, embora obrigado a comparecer, não pode ser coagido a contar fatos cobertos pelo sigilo profissional3. Do mesmo modo, o jornalista não pode ser obrigado a quebrar o sigilo da fonte (CF, art. 5º, XIV)4.
Embora qualquer pessoa tenha capacidade para ser testemunha (CPP, art. 202), mas as pessoas da família do investigado não são obrigadas a prestar compromisso de falar a verdade: falam apenas como depoentes (CPP, art. 206), não como testemunhas, na acepção própria do termo.
Dessa maneira, a questão, ao afirmar que o direito ao silêncio estende-se à pessoa convocada para depor em CPI, apresenta ambiguidade insolúvel, pois é possível interpretar que a assertiva se refere à testemunha (o que a torna errada) ou aos meros depoentes (o que a torna correta). Como o candidato não teria condição de resolver a ambiguidade, a melhor solução é a ANULAÇÃO da afirmativa.
Nestes termos,
espera deferimento.

1 O réu tem o direito constitucional de permanecer calado (CF, art. 5º, LXIII), tem direito ao silêncio, direito de permanecer calado – e, óbvio, esse silêncio não pode ser interpretado em prejuízo da defesa, como decorrência do direito de não produzir provas contra si mesmo. O STF considera, inclusive, que o acusado pode até mesmo mentir acerca do fato criminoso, de negar a verdade, sem que com isso cometa qualquer irregularidade, pois a defesa tem de ser ampla. Advirta-se que é diferente a situação da testemunha, a qual tem o dever de dizer a verdade e responder a todas as perguntas que lhe são feitas, sob pena de cometer o delito de falso testemunho (CP, art. 342)” (CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Roteiro de Direito Constitucional. Brasília: Grancursos, 2011, p. 287). Cf. STF, Pleno, HC 68.929, Relator Ministro Celso de Mello, RTJ 141/512.

2TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 1228. No mesmo sentido: 1) BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional, p. 893; 2) HOLTHE, Leo Van. Direito Constitucional, pp. 652-653; 3) MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 429.
3 BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. Op. Cit., p. 894. Igualmente: STF, Pleno, HC 71.231/RJ, Relator Ministro Carlos Velloso, DJ de 31.10.1996.

4 Idem, ibidem, p. 894.

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